quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Cadências Padrão

Existem situações que ocorrem repetidamente no repertório da música popular. Talvez a mais contundente dela seja o ritmo. No choro, por exemplo, é comum o ritmo sincopado em compasso binário. Mas também há situações harmônicas que são exploradas insistentemente pelos compositores. Elas são o tema do ensaio de hoje.

1- Definição

O acorde, como se sabe, é uma combinação vertical de determinadas notas. O acorde de Dó maior, por exemplo, é a combinação simultânea das notas dó, mi e sol.
Quando se produz uma sequência de acordes, isto é, quando se encadeia acordes, temos o que chamamos de cadência harmônica.
Contudo, existem certos encadeamentos que são constantemente utilizados pelos compositores de jazz, bossa nova e mpb. Por serem repetitivas, tais cadências se chamam cadências padrão.

2- Tipos de Cadência

Os dois tipos mais rudimentares de cadência são a cadência perfeita e a cadência plagal.
A cadência perfeita consiste na sequência de um acorde dominante que vai em direção à tônica.
Exemplos:

  • G  | C
  • A  | D
  • E  | A
  • D  | G
Obviamente que os acordes podem ser enriquecidos com a sétima, tornando-se tétrades. As mesmas cadências ficariam então de tal modo:

  • G7  | C7M
  • A7  | D7M
  • E7  | A7M
  • D7  | G7M
Já a cadência plagal consiste na marcha de um acorde subdominante em direção ao acorde da tônica.
Exemplos:
  • F | C
  • C | G
  • D | A
  • G | D
Que poderiam se tornar tétrades:
  • F7M | C7M
  • C7M | G7M
  • D7M | A7M
  • G7M | D7M
Não raro, a cadência perfeita é precedida pelo acorde da subdominante, tornando o encadeamento mais efetivo e afirmando definitivamente o tom.
Há músicas totalmente construídas apenas com esses dois tipos de cadência, apenas variando a ordem e a duração dos acordes.

3- Cadências Padrão
Contudo existem cadências mais longas e ligeiramente mais complexas que as cadências básicas, que chamaremos de cadências padrão.

A primeira consiste em substituir a subdominante da cadência perfeita pelo acorde da supertônica, isto é, o acorde do segundo grau.

  • IIm | V | I ou
  • IIm7 | V7 | I7M.
Alguns exemplos:
  • Dm7 | G7 | C7M
  • Em7 | A7 | D7M
  • Gm7 | C7 | F7M
  • Bm7 | E7 | A7M
A segunda consiste numa pequena variação da primeira, colocando-se o acorde da superdominante após o acorde da tônica.
  • IIm | V | I | VI ou
  • IIm7 | V7 | I7M | VIm7.
Exemplos anteriores modificados:
  • Dm7 | G7 | C7M | Am7
  • Em7 | A7 | D7M | Bm7
  • Gm7 | C7 | F7M | Dm7
  • Bm7 | E7 | A7M | F#m7

Já a terceira precede o acorde da supertônica pelo seu dominante relativo.
  • V7/II | IIm7 | V7 | I7M
Exemplos:
  • A7 | Dm7 | G7 | C7M
  • D7 | Gm7 | C7 | F7M
  • F7 | Bbm7 | Eb7 | Ab7M
  • E7 | Am7 | D7 | G7M
Não é incomum que tal cadência ocorra imediatamente após o aparecimento da tônica na peça.  Tais exemplos poderiam ser modificados assim:
  • C7M | A7 | Dm7 | G7 | C7M
  • F7M | D7 | Gm7 | C7 | F7M
  • Ab7M | F7 | Bbm7 | Eb7 | Ab7M
  • G7M | E7 | Am7 | D7 | G7M

A quarta cadência acrescenta nada mais do que o acorde da mediante antes do acorde dominante relativo da supertônica. Isso promove um movimento que é idêntico à cadência perfeita precedida pelo acorde da supertônica. Em outras palavras, o acorde da mediante funciona como um acorde da supertônica em relação ao acorde dominante relativo da supertônica e está situado um tom acima dela.

  • IIIm7 | V7/II | IIm7 | V7 
Alguns exemplos:
  • Em7 | A7 | Dm7 | G7
  • Am7 | D7 | Gm7 | C7
  • Dm7 | G7 | Cm7 | F7
  • Gm7 | C7 | Fm7 | Bb7
A quinta cadência caracteriza-se pela presença do dominante relativo da dominante, antes da cadência perfeita.
  • V7/V | IIm7 | V7 | I7M
Na realidade, o dominante da dominante tem sua resolução atrasada, mas não deixa de resolver. Essa cadência está presente no início de diversas músicas populares, como "Garota de Ipanema".
  • G7 | Gm7 | C7 | F7M (Garota de Ipanema)
  • A7 | Am7 | D7 | G7M (Desafinado)
  • D7 | Dm7 | G7 | C7M (O Pato)
  • E7 | Em7 | A7 | D7M (Take the ´A´ train)
Já a sexta cadência adiciona um acorde à cadência anterior. Este é o acorde da supertônica relativa à dominante relativa à dominante, que nada mais é que o acorde da superdominante.

  • VIm7 | V7/V | IIm7 | V7
Também esta cadência é encontrada no final de muitas canções populares.
  • F#m7 | B7 | Bm7 | E7 (Isn´t she lovely)
  • Bm7 | E7 | Em7 | A7 (A Rita)
  • Em7 | A7 | Am7 | D7
  • Am7 | D7 | Dm7 | G7
Finalmente a sétima cadência constitui-se na cadência perfeita relativa ao acorde da subdominante.
  • (I7M) IIm7 rel. | V7/IV | IV7M
Exemplos:
  • C7M | Gm7 | C7 | F7M
  • F7M | Cm7 | F7 | Bb7M
  • G7M | Dm7 | G7 | C7M
  • A7M | Em7 | A7 | D7M
4- Cadências Padrão com Acordes Diminutos
Os acordes diminutos são largamente utilizados, principalmente para formar semitons entre dois acordes que são naturalmente distanciados por um tom. Vejamos as principais situações.
  • I7M | #Iº | IIm7 (ex.: C7M | C#º | Dm7)
  • IIm7 | #IIº | IIIm7 (ex.: Dm7| D#º | Em7)
  • IV7M | #IVº | V7 (ex.: F7M | F#º | G7)
  • V7 | #Vº | VIm7 (ex.: G7| G#º | Am7)
  • IIIm7 | bIIIº | IIm7 (ex.: Em7| Ebº | Dm7)
  • VIm7 | bVIº | V7 (ex.: Am7| Abº | G7)
5- Cadências Padrão com Acordes de Empréstimo Modal
Também existem cadências padronizadas nas quais aparecem acordes de empréstimo modal. São apenas três as mais comuns.
  • IV7M | IVm7 | I7M
  • IVm7 | bVII7 | I7M
  • bVI7M | bII7M | I7M
6- Conclusão
Tendo as cadências padrão em mente, o compositor poderá se valer delas para escrever uma música inédita ou rearranjar músicas já existentes. Além disso, é possível compreender como os outros compositores realizam seus procedimentos composicionais.